Um breve prefácio e saudação.

Como seria se um torcedor narrasse um jogo do seu time? E que se pudesse escrevê-lo nas principais manchetes de jornais? Quando isso foi possível o jornal era o principal meio de comunicação, juntamente com o rádio. E lá estava estampado “A Manchete Esportiva”. Estimulado por Nelson Rodrigues, e por minha paixão como torcedor, resolvi retransmitir os relatos de hoje como no passado. Porque quando a história deixar de ser importante para o futebol, não haverá mais torcedores.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

1974, Vasco primeiro carioca campeão brasileiro.

O ano era 1974. Ano importante para vascaínos, brasileiros e, porque não, luso-brasileiros.
O que acontecia em 1974?
Os anos de chumbo de Médici se foram. Ocorreu a abertura política lenta, gradual, segura e bendita, que toda professora de história nos fala na 5ª série, o medo tinha um refúgio. O partido de oposição, MDB, ganhou a maioria das eleições indiretas das prefeituras das cidades, entretanto, em janeiro de 1974, Ulysses Guimarães e Barbosa Lima Sobrinho (MDB) são derrotados pela “ARENA” de Geisel, uma goleada 400 a 76.
São Paulo. Era o mês de fevereiro quando o edifício Joelma pegou fogo, 188 pessoas perderam a vida. 188 tiveram que morrer para mudar o Código de Obras vigente desde 1934! O prédio tinha 25 andares, 10 de garagem. Um curto-circuito provocou o desastre, que comoveu o país e o mundo.
No Rio de Janeiro tinha como senadores dois da oposição: Danton Jobim (Estado da Guanabara) e Saturnino Braga (Estado do Rio de Janeiro).
Ora, ora. O carnaval de 1974 foi diferente. Devido às obras no metrô, o desfile foi transferido para a Avenida Antonio Carlos. O Acadêmicos do Salgueiro, com o enredo: O Rei de França na Ilha da Assombração, tornou-se campeão pela sexta vez. O carnavalesco era Joãosinho Trinta, discípulo de Fernando Pamplona, venceu o primeiro dos cinco títulos seguidos que conquistaria (dois pelo Salgueiro e três pela Beija-Flor) de 74 a 78.
Em 9 de março começava o Campeonato Brasileiro de Futebol.
Houve uma pressão para que aumentasse o número de participantes nesta edição, porém as atenções da CBD ficaram somente para a Copa do Mundo e permaneceram as 40 equipes para disputar o título nacional. Falando em Copa...
A 10ª Copa do Mundo aconteceu na Alemanha Ocidental no dia 13 de junho a 7 do seguinte. O Brasil defendia o título e contava com as estrelas consagradas de Jairzinho e Rivelino. As seleções utilizariam, pela primeira vez, a numeração nos calções. Mais países assistiriam a uma Copa do Mundo pela TV. Agora, a cores! Mais pessoas, enfim, poderiam ver a seleção canarinha e a laranja mecânica sem se confundirem. O Brasil acabaria enfrentando a Holanda com camisas azuis, ofuscando o brilho dos olhos dos fãs de nosso futebol, ofuscando toda campanha para o tetra. Brasil para a disputa do terceiro lugar. E para surpresa, sim, de todos, o campeão continuou preto e branco; A Alemanha Ocidental é bicampeã mundial, junta-se com Itália (34 e 38) e Uruguai (30 e Maracanazo) e fica a um título do Brasil.
Emerson Fittipaldi honraria o ano esportivo do Brasil em outubro. Com três pilotos concorrendo ao título na última corrida, o brasileiro chegou em quarto, deixando a Ferrari de Clay Regazzoni em décimo lugar no Grande Prêmio dos Estados Unidos. Jody Scheckter abandonou a prova. Com o resultado, Fittipaldi tornou-se bicampeão mundial de Fórmula 1.
Por terras de Vera Cruz, o campeão brasileiro era também preto e branco, mas por um detalhe, um mínimo detalhe, e ele é vermelho. E o detalhe vira insígnia, vira marca, vira paixão...

Na edição 1974, a inovação ficou por conta do critério de classificação. A maior renda classificaria Fluminense e Nacional-AM para a segunda fase. Como assim? É, como assim? 40 clubes são divididos em dois grupos, todos jogam contra todos em apenas um turno. Os 10 primeiros de cada se classificavam pra segunda fase. Até aí está fácil de entender. Entretanto a esses 20 times, juntavam-se outros dois que tiveram a melhor campanha dos que foram “eliminados”. Ou seja, o Tiradentes que ficou em 11º lugar no grupo A com 19 pontos foi eliminado porque Goiás e Palmeiras (11º e 12º do grupo B) terminaram a primeira fase com 20 pontos. Então temos até agora 22 classificados. Agora vem a cereja do bolo ou o desafino da orquestra. O outro critério de classificação era o de maior média de renda dentre os desclassificados. Os dois maiores foram para a próxima etapa, Fluminense e Nacional-AM. Não sei o que a CBD pensou no que isso podia influenciar em bom futebol. Sinceramente eu não sei. Acho que o importante era ver o time jogar. Perder era um mero acaso, de preferência de W.O. para não perder a novela das 8 da Globo, Fogo sobre Terra.
Os 24 gladiadores dividiram-se em quatro grupos de seis, todos contra todos em um turno. Os lendários campeões de cada grupo, ou seja, os quatro, se enfrentariam em um quadrangular decisivo.
Era mais fácil ocorrer a abertura política e o restabelecimento da democracia no Brasil, do que sair um campeão brasileiro em 74.
Enfim, Vasco da Gama, Cruzeiro, Santos e Internacional decidiriam o título. Haveria um novo campeão brasileiro. Mas quem disse que seria fácil? Vasco e Cruzeiro empataram o quadrangular em primeiro com quatro pontos, dois a mais que Santos e Internacional. Tá difícil! Mas aí entra em campo o personagem que iria mudar a história desse campeonato, a arma mortífera do time carioca, poupado, decidiu jogar somente a final: o Regulamento.
Regulamento: estatuto; regra; norma; prescrição.
E a regra era: em caso de empate haveria uma partida extra com o mando de campo do clube com melhor campanha. Justo! E eram os mineiros. Contudo, ele, o regulamento, começava a decidir o campeonato. O artigo 59 dizia que:
“Quando houver tentativa de agressão ou agressão por parte do público ou de dirigente, associado ou empregado do clube local a árbitro, seus auxiliares, dirigentes, empregados ou jogadores do clube visitante, o Departamento de Futebol da CBD reestruturará a tabela do Campeonato, invertendo o mando de campo de três jogos subsequentes do clube local”.
Durante o quadrangular final, Cruzeiro e Vasco se enfrentaram no dia 24 de julho em pleno Mineirão, terminou 1 a 1 com gols de Zé Carlos (Cruzeiro) e Alfinete(Vasco). Neste jogão, o vice-presidente da raposa, Carmine Furletti, invadiu o campo para reclamar com o árbitro Sebastião Rufino, após um lance na área dos cariocas envolvendo Palhinha e Joel. Para os cruzeirenses aquela partida seria decisiva, pois o Vasco estava liderando com o empate e pegaria o Inter no Maracanã para ser campeão. Entretanto os cruzmaltinos que venciam os colorados por 2 a 0 no primeiro tempo, cederam o empate na etapa final, igualando-se ao Cruzeiro, que vencera o Santos por 3 a 1.
Pois bem, partida extra em pleno estado de nervos. Naquele tempo não havia mais regulamento para os cruzeirenses e sim um Ato Institucional número 5 do carioca Emílio Garrastazu Médici, conspirando para a derrota mineira.
O jogo foi no maior do mundo, com um público (que saudade) de 112.933 pessoas, apitado por Armando Marques no dia primeiro de agosto de 1974. Com gols de Ademir (Vasco) aos 14’, Nelinho (Cruzeiro) aos 64’ e Jorginho Carvoeiro (Vasco) aos 78’ estava decidido o campeão brasileiro.
Como a Holanda de 1974, o favorito Cruzeiro, com craques como Nelinho e Piazza, jogadores da seleção brasileira na Copa da Alemanha, ficou com o vice.
Club de Regatas Vasco da Gama. Venceu na garra, na superação e no detalhe... aquele detalhe, que não é só preto e branco alemão, mas também o vermelho. Vermelho sangue, vermelho Cruz de Malta.
Vasco: Andrada; Fidelis, Miguel, Moisés e Alfinete; Alcir, Zanata e Ademir; Jorginho Carvoeiro, Roberto Dinamite e Luis Carlos. Técnico: Mário Travaglini

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O clássico filme preto e branco.



O jogo valia muito mais que três pontos. Era assim, preto no branco: se o Corinthians vencesse podia assumir a liderança, já se o vencedor fosse o Botafogo ajudaria o clube a estar mais perto da vaga para a Libertadores. O Pacaembu, que há 15 anos foi palco da maior glória do time de General Severiano, também era preto e branco como na final de 1995. Pareciam torcedores de um só time, entretanto haviam dois: o preto e o branco. Não haveriam vagas para outras cores. O que era preto em um time era branco no outro. Como um filme clássico, como um clássico do futebol brasileiro.
Logo no início do jogo, a menos de três minutos os donos da casa abrem o placar com um golaço de Bruno César. Deu um branco na defesa do Botafogo. De fato seria goleada. Foi o gol 100 do Corinthians na temporada. A temporada do centenário. Tudo dava certo para o Timão. Até a trave ajudou no chute do uruguaio Loco Abreu, que apareceu sozinho depois do escanteio.
Com o resultado eles estavam pulando para a primeira posição na tabela. A torcida paulista gritava: “Aqui tem um bando de loucos, loucos por ti Corinthians...”. Foi aí que somente um “Louco” resolveu calar o bando. Cruzamento do argentino Herrera na cabeça de Loco Abreu. Gol carioca. Gol do empate. Belíssima jogada Mercosul. Para tristeza botafoguense, Herrera pouco tempo depois recebe seu terceiro cartão amarelo e está fora do grande clássico contra o Flamengo. Foi o cartão amarelo mais negro que a torcida carioca já viu.
 No segundo tempo quem deu o ar da graça foi o Sr. Leandro Pedro Vuaden, juiz da partida. Herrera, do time preto, recebe a bola na grande área e arremata para o gol do time branco. Gol. Era a virada. Bandeira levantada. Impedimento. Era gol legal. Era gol claro.
Os paulistas acordam e vão pra cima. Paulinho entra sozinho na área do Botafogo, abriu-se uma avenida para o corintiano, chance clara de gol. Jeferson faz excelente defesa.
O tempo passa e o empate não era bom para os donos da casa. Pior ainda foi ouvir, na caixa de som da arquibancada, o gol do Fluminense sobre o Avaí, que deixava o tricolor carioca com a primeira colocação isolada. O desespero transformou-se em covardia. Jeferson defende uma bola pelo alto e Elias faz falta, que o Sr. Leandro Vuaden não marca. O goleiro se machucou e jogou a bola para lateral para ser atendido. Ora, um clube centenário, ganhador de títulos no futebol, devolveria a posse de bola ao time botafoguense. O Corinthians não. Jogou como se tivesse um ano, como se acabasse de nascer. Para completar o estrago, o árbitro, no fim da partida, mostra o terceiro cartão amarelo para o zagueiro carioca Antônio Carlos, por solicitar a maca. Está fora do derby contra o rubro-negro carioca. Mais um jogador fora.
              O empate da derrota para os paulistas fazem do time mais ofensivo. Numa descida dessas o ataque corintiano perde a bola no meio-campo e Caio, que havia entrado no lugar de Herrera, avança com a bola. Eram três cariocas e dois paulistas. Era o lance do jogo. Para calar o bando de loucos. Caio resolve encobrir o goleiro Julio César. Erra! Caio não é mais o mesmo do Campeonato Carioca. O jogador amuleto do Fogão mudou da água para o vinho. Do preto para o branco.
Fim da partida e o empate deu finalmente uma cor ao clássico. Aliás uma não, três. O empate da derrota corintiana é tricolor. Nunca o Botafogo usou tantas cores em um jogo. Nunca o Fluminense foi tão.... preto e branco.